Portunhol é a língua usada para se ‘safar’ na fronteira 6l5i45
Portunhol é a mistura do português com o espanhol na fronteira da Bolívia e Brasil e a miscelânea dos dois idiomas, além do guarani no Paraguai 3u5a56
A mistura entre a língua portuguesa e o espanhol, o Portunhol, é o que faz muito brasileiro “se safar” quando precisa cruzar a fronteira e fixar residência em países vizinhos ao Brasil, na divisa com Mato Grosso do Sul, como Paraguai e Bolívia. Isto porque as semelhanças entre os idiomas facilitam a comunicação. Por outro lado, as diferenças fazem muita gente ar por verdadeiros perrengues.

Esta semana, o Primeira Página dá início a uma série de reportagens sobre o Portunhol, uma “língua” de muitos que vivem nas fronteiras de Mato Grosso do Sul e já serviu de inspiração para poemas, pesquisas, documentários e músicas.
Os desafios enfrentados por jovens e adultos que decidiram estudar abrem a série nesta quinta-feira (3).
¡Hola! ¿Qué tal? j104e
Quando a estudante de Medicina Alyne Maia, de 37 anos, esbarrou em um ageiro de ônibus na Bolívia, disse: “Opa, desculpa” e essa pessoa se sentiu ofendida, ela percebeu uma das inúmeras diferenças entre a língua portuguesa e o castelhano. Por lá, a interjeição significa algo como tonto. “Eu fui para a Bolívia sem saber nada de espanhol. Fui na sorte”, resume a campo-grandense.

E ela contou muito com a sorte para se fazer entender durante os primeiros anos em que morou na cidade de Santa Cruz de la Sierra. Mas teve muito improviso também. Para comprar coisas simples como alho, por exemplo, ela pesquisava na internet e mostrava a figura. A tradução em espanhol desta planta é ajo (pronuncia-se arro). O problema é que quando ela dizia “arro”, ela recebia arroz em troca porque os bolivianos costumam subtrair o z desta pronúncia.
Um deles gravou a diferença das pronúncias entre alho e arroz para o Primeira Página. Confira:
Atualmente, Alyne diz conseguir entender e se fazer entender no país. “Agora falar é um pouco mais difícil porque tem a pronúncia, o sotaque e as palavras que são escritas iguais, mas com significado diferente. Complica mais ainda”.
Falsos amigos 2454t
As palavras a que Alyne se refere são os cognatos, popularmente conhecidos como falsos amigos, lembram muito alguns vocábulos do português, mas significam coisas totalmente diferentes. Quem ficou confusa com alguns deles foi a médica Jenipher Pereira Cordeiro, de 28 anos, à época em que fazia faculdade na Bolívia.
Ela cita asignatura que quer dizer disciplina escolar; apellido cuja tradução é sobrenome; o pastel de lá é nosso bolo aqui e nosso pastel é empanada no país vizinho. “No começo não entendia muito o que os professores falavam porque eles falavam muito rápido, mas depois eu me acostumei, me adaptei. Não demorou muito não, foi rápido, por causa do dia a dia”.
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Quem também não entendia muito das aulas é a também médica Lorrayne Silva, de 30 anos. Filha de missionários evangélicos ela deixou Corumbá e foi morar no país vizinho aos 14 anos. ” Entrei na 8ª serie lá e era praticamente a única brasileira da escola. Eles não entendiam e a gente também não porque falavam rápido. Ainda têm as gírias que complicavam muito mais”, lembra.

Lorrayne saiu da Capital do Pantanal direito para o centro comercial da Bolívia, Santa Cruz. “Ali na fronteira eles entendem um pouco mais porque tem um contato maior com os brasileiros. Lá não entendem nada e a gente também não. Foi bem difícil no começo”.
Atualmente, Lorrayne mora em Três Lagoas e diz sentir falta daquele contato maior com “los hermanos bolivianos”. De tanto conviver com eles, hoje entende perfeitamente o castelhano. “Foi uma sofrência boa para aprender”.

Não chegou a ser sofrimento, mas o médico Júlio Brandão, de 29 anos, lembra de algumas confusões que fez com o idioma ao deixar Corumbá para estudar na Bolívia, como pedir “cueca-cuela” em uma conveniência. A pronúncia correta da marca é igual a do Brasil, a diferença é o som da letra “o” mais fechado no país vizinho.
Hoje em dia, ele consegue entender o idioma e até escrever sem dificuldades, mas confessa que evita falar até o Portunhol. “Sempre tive vergonha de falar errado, então acaba que não falo muito. Mas se colocar alguém para falar comigo acredito que consiga porque o conhecimento fica”, diz.
Portunhol do Paraguai 603z5g

Quem também está adaptada ao idioma e cultura que julga tão bonitos é Vitória Ferreira, de 29 anos, que deixou o estado do Pará para estudar no Paraguai. Ela pontua ser muito difícil encontrar uma pessoa que fale apenas um idioma naquela fronteira.
“Ao mesmo tempo que estão conversado com você em espanhol, misturam o português, misturam o guarani. Mas o portunhol em si é fácil de você aprender e entender o que as pessoas estão falando. Você vai aprendendo com o tempo”, diz Vitória.
O maior perrengue que ela diz ter ado em Pedro Juan Caballero, onde mora, foi pedir bolo na padaria esperando realmente receber o alimento. Voltou para casa com uns pães e só depois entendeu que deveria ter solicitado sopa de chocolate.

A biomédica e acadêmica de Medicina Santusa da Silva Gonçalves, de 41 anos, opina que a vergonha é um fator que impede muita gente de arriscar até o portunhol nas fronteiras, mas após três anos vivendo no Paraguai disse ter vencido esse obstáculo.
“A gente acha que não vai conseguir falar, não vai conseguir se comunicar. Ás vezes por vergonha, medo de falar errado, de estarem caçoando do sotaque a gente não fala. Mas pensei: se o paraguaio, o uruguaio, o colombiano ou qualquer outro estrangeiro fala com sotaque por que eu não posso">Quero deixar minha opinião!